Precisamos Falar Sobre O Kevin - Lionel Shriver, por Trinta.

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Estava eu divagando hoje mais cedo sobre como não ser tendencioso quando o assunto é “meus livros de cabeceira”. Não, eu não estou sendo filosófico à toa. Eu realmente fui levar minha cadela para passear pensando na crítica que eu mais gostaria de fazer aqui no Escolhendo Livros. E sério, isso não é uma coisa fácil de fazer quando seu cachorro é hiperativo.Primeiro pensei em deixar o livro para outra pessoa criticar, simplesmente por achar minha opinião desnecessária e voluptuosa. “É claro que eu vou falar bem do livro!”, vociferei para mim mesmo, “A última coisa que esse povo precisa ouvir é elogios ininterruptos que não vão ajudar em nada na tarefa de realmente escolher um livro”. Vai por mim, você compraria um livro simplesmente pelos elogios de uma pessoa? Todo mundo só entende mesmo um elogio se ele vem separado por um defeito. O problema é que Precisamos Falar Sobre o Keviné o melhor livro que li em 2011 sem qualquer questionamento sobre isso e acredite... Eu não sei exatamente o que falar de errado dele. Ele é amargo, sincero demais e completamente problemático. Tudo que Rafael Trinta mais gosta em uma escrita misturado com uma de suas temáticas favoritas: O intenso e perturbador universo familiar.

O grande sucesso da autora Lionel Shriver nos apresenta os embates corrosivos da protagonista Eva Khatchadourian consigo mesma para reatar as memórias de sua vida com o marido Franklin e o seu filho primogênito, Kevin. Tudo isso poderia ser mais um simples relato sobre os altos e baixos de uma família qualquer... Se “qualquer” não fugisse completamente da realidade dos Katchadourian. Kevin, carinhosamente apelidado pela mídia de “K.K”, é o que nos conhecemos como “um daqueles Meninos Columbine”, responsável por matar sete colegas, uma professora e um servente no ginásio de seu colégio em Nova York. Desde então, Eva sobrevive com o questionamento que nenhuma mãe gostaria de ter: Culpada ou inocente? Em busca da possibilidade de uma resposta, Eva nos narra toda uma vida perdida nas lembranças de um casamento estraçalhado, uma carreira abandonada e em uma das relação mãe-e-filho mais inesquecíveis da literatura norte-americana.

Precisamos Falar Sobre O Kevin tem o dom de questionar os valores familiares de uma forma tão atraente que é possível até caracterizá-lo como um livro fácil de ler. Não sei se tenho um estômago forte, mas eu o engoli em menos de sete dias. Sim, por mais chocante que seja We Need To Talk About Kevin, o tom intimista da narrativa prepara o leitor lentamente até as maiores atrocidades acontecerem, o que torna o tema tabu bem mais acolhedor aos nossos olhos. O “engraçado” é o quanto eu recolhi opiniões diferentes sobre o livro dentro do meu círculo de amigos quanto as várias situações vivenciadas pela mãe. Uma delas, a qual me chamou atenção exatamente pela diferença quanto a minha própria interpretação, isentou boa parte da culpa de Kevin, defendendo-o como  “apenas um menino normal inserido em um contexto muito errado”. Eu sempre vi como certo que o menino era doente desde seu nascimento, mas exatamente por essa discordância com minha amiga que eu percebi o quanto o Lionel soube construir um material reflexivo. Quantos Kevins podem ser montados em nossa imaginação? Eu particularmente sou um pouco apaixonado pela genialidade controversa do meu. Acredito que talvez ele tenha uma alma (Se alguém ler o livro e voltar aqui um dia, lembre-se da parte do documentário e também a da livraria).

A galinha de ouro do livro é o aprendizado que ele conseguiu “transformar”em mim - e são POUCOS os romances que eu realmente pude afirmar isso. Sempre quando penso que possa ter sido intolerante com pessoas que fizeram alguma merda na vida – desde falar mal até matar alguém – uma certa vozinha interior sussurra na minha cabeça algo como “Decisões erradas sempre são carregadas de um contexto mais complexo do que você imagina” e eu lembro o  quanto aquele ali poderia ser eu. Acha que não? Claro que poderia. Todos nós temos o potencial de sermos monstros em backgrounds diferentes. Ou você acredita mesmo que a sanidade é algo puramente biológico?

Ah sim, não posso esquecer de comentar um pouquinho sobre a adaptação cinematográfica feita por Lynne Ramsay.  Lançado ano passado e com uma boa repercussão no Festival de Cannes, o filme trouxe Tilda Swinton para o papel de Eva – o que lhe rendeu até nomeações ao Golden Globe 2012! - e um talentoso Ezra Miller para o nosso “querido” Kevin.  Assim como no livro, a narrativa não é muito linear, o que para mim é um ponto positivo, apesar de alguns problemas sérios no casting (“Vamos transformar Um drama familiar em O bebê de Rosemary!”). Dá uma olhadinha no trailer:

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3 comentários:

  1. O ultimate birth control livro do ano. Eu o chequei parcialmente, só uns 6 capítulos - leia-se: de graça, na livraria.

    Eu sei como você se sente sobre esse livro, e nós vimos o filme juntos *gira* então você sabe o que eu penso também! Mas vou comentar mesmo assim:

    Problemas monetários me impedem de comprar livros como We need to talk about Kevin. Ele cai naquela pilha de livros que eu sou curiosa o suficiente pra querer ler, mas não o suficiente pra gastar 45 reais que, no final das contas, acabaram indo todos investidos nas séries do Jogos Vorazes.

    Mas se eu ler um dia, vai ser por conta da narrativa da Eva, que é a coisa que mais chama minha atenção. Você deve ter achado isso também. Eu gosto muito de quem ela é e justamente por ser com ela que acontece o fato de ter um filho como o Kevin é que me interessa a ler - como uma pessoa como ela, com as peculiaridades dela, se comportaria perante tal situação. (Nós sabemos o que pais clichês fariam: só chorar e se esconder em quartos de hotel, como aconteceu com os pais em Beautiful Boy)

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  2. O Kevin é um garoto autista? Pelo pouco que vi do trailer, percebi que ele tem dificuldade em aprender, é anti-social e agressivo, características comuns da doença.
    Me parece ser um livro muitíssimo interessante e seu texto atiçou ainda mais minha curiosidade!


    Adorei a ideia da parceria.
    Me envie o banner do Escolhendo Livros pra eu colocar lá no meu blog.
    O banner do Querido Livro esta na coluna direita, acho que você já o viu ali :)

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    1. O Kevin é introspectivo, um tanto quanto perverso e sim, digamos que ele seja uma criança doente... Apesar de que não é algo determinado no livro (ele deixa mais para a interpretação de cada leitor). E mais uma vez, obrigado pelo apoio, Rafa! *-*

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