Conto inédito hoje no EL! A autora Laísa Couto nos apresenta hoje ao conto "O Lenhador, a Bruxa e a Lua Cheia", um spin-off da série Lagoena. "Mas quem realmente é a nova moradora do vilarejo?"
O Lenhador, a Bruxa e a Lua Cheia
por Laísa Couto
Era noite de festa num distante vilarejo. A Lua brilhava em Lagoena, num tempo em que as criaturas da Terra Secreta não tinham pesadelos ou medo do amanhecer. Os homens, descontraídos, bebiam ao calor de uma grande fogueira, as mulheres se revezavam com bandejas nas mãos, enquanto as crianças corriam, trançando entre as pernas dos mais velhos.
Comida e bebida foram servidas durante toda noite. Os mais sensatos moderaram as doses, partindo para seus lares logo cedo, os mais gulosos, se fartaram à vontade até o último leitão assado e os que se diziam lúcidos encheram suas canecas até o dia clarear.
Quando rompeu a aurora, o vilarejo se enchia novamente de vida, um viúvo lenhador despertava. Atordoado com a tênue claridade, viu o mundo girar ao seu redor, fazendo sua cabeça zunir. Lembrou-se da noite anterior e das grandes canecas de bebida fermentada que consumira no festejo. Tomando fôlego, se levantou meio trôpego e se deparou com uma bela moça adormecida ao seu lado. Chocado, percebeu quem era: a nova moradora do vilarejo, assunto das últimas semanas, principalmente das rodas masculinas, que elogiavam sua beleza. O lenhador vestiu-se com pressa e partiu, deixando a jovem em seu sono.
Arrependido, o lenhador não se lembrava de como cortejara aquela moça ao ponto de seduzi-la. Desde que sua esposa falecera, deixando a única filha, nunca se permitiu se unir a mais ninguém. Aconteceu que naquele mesmo dia se espalhou a notícia de que o viúvo lenhador teria pedido a moça em casamento. Jovens solteiras invejaram a sorte da moça, que teria uma família para cuidar. Velhas fofoqueiras não pouparam especulações sobre a origem da agora noiva, que aparecera repentinamente no vilarejo.
O lenhador, desesperado, tratou de procurar a jovem para desfazer o noivado, pois quando fizera o pedido não estava sóbrio, além disso, não era o que seu coração desejava. E ela, quando viu seu casamento desfeito, encheu-se de ódio e gritou para todos ouvirem:
— Ouça bem, lenhador! Quando a noite cair e a grande Lua amarela subir, seu coração sangrará de dor! Levarei embora aquela que sempre teve ao seu lado!
O homem não deu confiança à moça, afinal, estava transtornada com o fim do casório. Assim voltou para casa, com o peso da culpa nos ombros, mas logo que viu a sua filhinha, todo aquele mal entendido dissolveu de sua mente e o restante do dia transcorreu tranquilo. Rápido, chegou a noite, com ela a Lua cheia e todos foram dormir.
Quando, enfim, amanheceu o lenhador percebeu com horror que sua pequena filha havia desaparecido, então, lembrou-se da ameaça da moça no dia anterior. Correu até sua casa no fim do vilarejo, arrombou a porta e não encontrou ninguém. Os moradores, compadecidos, em grupos se espalharam pelas redondezas. A procura foi em vão, não encontraram nenhuma pista da filha do lenhador e de sua ex-noiva, uma bruxa.
Passaram-se dias, semanas e o homem saía todos os dias à procura de sua filhinha, até, quando, na noite da primeira Lua cheia após seu sumiço, escutou um choro infantil ao longe dentro da floresta. Procurou até a noite entrar na madrugada, a Lua amarela se esconder no horizonte e a noite cessar. Procurou durante os dias e as noites seguintes, até escutar novamente o choro de sua filhinha na floresta em outra noite de Lua Cheia.
Acontece que a bruxa enfeitiçou um poço e trancou a filha do lenhador lá dentro e para enlouquecê-lo de tanto a procurar, escutaria seu choro em noites de Lua cheia sem que pudesse alcançá-lo e tirar a menininha de lá.
Assim, anos se foram e mais velho o lenhador ficou, porém ainda continuava sua procura, na esperança de encontrar sua querida filha, seja numa noite de Lua cheia ou em outra qualquer.
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